domingo, 22 de março de 2009

A Maldição da "Radiohead"

O que é radiohead? A maioria dos leitores responderia a essa pergunta dizendo que é o nome de uma ótima banda inglesa, que tem em seu currículo discos de extrema relevância, responsáveis por uma significativa transformação do rock a partir de meados dos anos 90. Outra possível resposta seria a de que, em bom português, radiohead é rádio-cabeça. Não sei se para Thom Yorke e cia. esse é apenas um nome qualquer ou se faz algum sentido em inglês, mas, traduzido, coincide com uma espécie de maldição.

Está confuso? Explico: rádio-cabeça é aquela estação de rádio que transmite repetidas vezes uma mesma música dentro de nossa própria cabeça, e que só a gente mesmo ouve. Não, não sou esquizofrênico, nem ouço vozes, ouço músicas, boas ou ruins que, invariavelmente, tornam-se, em questão de dias, irritantes. Músicas que eu não pedi para ouvir, mas que não posso evitar. Aposto que isso também já aconteceu com você.

Terça-feira, primeiras horas do dia. Você prepara o café na cozinha antes de ir para o trabalho. Através da área comum do prédio, é possível escutar o rádio da vizinha, que está lavando roupa. A qualidade da programação é bastante questionável, e você até acha graça naquela música que ela só ouve quando está feliz. O cantor soa descompassado, a letra é lastimável, e o arranjo, sequer merece comentários. Você termina a refeição e está pronto para começar um longo dia. Dentro do ônibus, distraído, batuca discretamente com as mãos no banco da frente. O ritmo contagia e logo surge uma melodia, que é prontamente assobiada; é a música do rádio da vizinha. “Olha só, eu assobiando essa música…”, você pensa, e trata de corrigir o repertório, assobiando algo de que gosta. Passou.

Depois do almoço, sobra um tempo no escritório e você decide arrumar a papelada, colocar as gavetas da sua mesa em ordem. Agachado no chão, tendo uma pilha de papéis ao seu lado, um colega pára ao lado de sua baia com um risinho sarcástico estampado no rosto:

- quem diria! não sabia que você gostava desse tipo de música…
- que música?
- essa que você estava cantarolando.
- eu? cantarolando?

A partir daí a situação muda de figura, você perdeu o controle. A música afoga seus pensamentos, martela sua cabeça, e aquele trecho (sempre o pior) se repete infinitamente. A vigília se intensifica - para o bem de sua sanidade - e qualquer pensamento musical passa a ser bloqueado. As músicas da rádio-cabeça são como uma doença contagiosa, uma praga, quanto mais rápido o combate, menor a chance de contaminação. Você decide que no dia seguinte tomará café da manhã na rua, só por precaução; assim, evita a nada remota chance de ouvir aquela determinada canção de novo. Manter a mente vazia é uma árdua tarefa, e você pede para o chefe qualquer trabalho, o tempo ocioso agora é seu inimigo. Não pensar naquela música é seu único objetivo, mas isso já é uma forma de pensar nela, então o melhor é relaxar.

A tática começa a dar resultado, é um alívio, diante das horas de batalha travada com esse DJ insano que reside dentro da sua cabeça. O silêncio ecoa em sua mente, tanto que você se distrai, acha que assobiou, mas não tem certeza. Pergunta ao colega da mesa ao lado, ele diz que não ouviu nada e passa a te olhar com desconfiança. Hora de ir para casa, uma boa noite de sono é a receita para por fim a essa obsessão. O ônibus pára no sinal ao lado um carro com o rádio no último volume, adivinha o que está tocando?

Você discretamente tenta tapar os ouvidos, mas não consegue deixar de ouvir, tenta cantar uma outra melodia por cima para abafar, inútil. A moça sentada ao seu lado sorri e canta de olhos fechados, curtindo, para seu azar é sucesso! Transtornado, você grita e ordena que ela pare de cantar. Sua reação surpreende os demais passageiros, que voltam os olhares para seu assento. Constrangido, você resolve saltar e terminar o percurso até em casa a pé. Dentro do apartamento, traumatizado, não consegue ir até a cozinha - onde tudo começou - buscar um copo d’água. Nem arrisca ligar a televisão e dorme torcendo para não sonhar. Por quase uma semana essa sina intercalará todos os seus pensamentos. Você vai cantar, assobiar, batucar, dançar, até que a música se esgote e te abandone, não existe outra alternativa.





Fonte: Instante Posterior - Bruno Medina

1 comentários:

Rafaela Rocha disse...

eu ri bastante, pois obcessoes com musicas ruins já aconteceu comigo.